Trump não recua: Governo Lula já trata tarifas como realidade
Segundo três fontes ouvidas pela BBC News Brasil sob anonimato, os recentes sinais vindos da Casa Branca deixaram claro para o entorno de Lula que os EUA pretendem levar a ameaça até o fim.

Integrantes do alto escalão do governo Lula já admitem, nos bastidores, que não há mais expectativa de recuo por parte do presidente Donald Trump. As tarifas de 50% sobre produtos brasileiros devem mesmo entrar em vigor em 1º de agosto, conforme anunciado. Oficialmente, o Planalto tenta manter o discurso da negociação, mas, na prática, reconhece que a margem para acordo é mínima neste momento.
Segundo três fontes ouvidas pela BBC News Brasil sob anonimato, os recentes sinais vindos da Casa Branca deixaram claro para o entorno de Lula que os EUA pretendem levar a ameaça até o fim. Entre esses sinais estão publicações firmes de Trump nas redes sociais contra o governo brasileiro e, sobretudo, a revogação de vistos de ministros do STF — incluindo Alexandre de Moraes — e do procurador-geral da República, Paulo Gonet.
Embora ainda se fale em uma eventual reversão da medida, como ocorreu em outros episódios envolvendo China e União Europeia, as chances de que isso ocorra no caso brasileiro estão se tornando cada vez mais remotas. Segundo as fontes, qualquer adiamento ou flexibilização das tarifas perdeu força nos últimos dias.
Com pouco mais de uma semana até o início das punições, o governo Lula se apoia em três frentes: manter diálogo formal com os americanos, tentar sensibilizar empresários e políticos nos EUA e, por fim, preparar retaliações.
Fontes ligadas ao presidente ainda recordam que Trump, em outras ocasiões, recuou após pressões econômicas — como no embate com a China, onde começou com 10% e chegou a impor tarifas de até 145%, antes de selar um acordo. Mas, no caso do Brasil, a situação parece diferente. Segundo um interlocutor, "a motivação aqui é puramente política".
O mesmo interlocutor destaca que o Brasil tem um histórico de déficit comercial com os EUA — de mais de US$ 410 bilhões em 15 anos — o que desmonta qualquer justificativa econômica para as tarifas. Para ele, o recado está claro: “Trump ligou diretamente as tarifas ao julgamento político de Bolsonaro pelo STF. Nenhum outro país teve sua política interna usada como pretexto. Isso é inédito.”
Um trecho da carta de Trump, usada como justificativa para as tarifas, evidencia o tom direto:
“A forma como o Brasil tem tratado o ex-presidente Bolsonaro, um líder altamente respeitado em todo o mundo durante seu mandato, inclusive pelos Estados Unidos, é uma vergonha internacional. Este julgamento não deveria estar acontecendo. É uma caça às bruxas que deve acabar IMEDIATAMENTE!”
Outro conselheiro do Planalto foi além e afirmou que as medidas americanas também têm como objetivo influenciar as eleições de 2026. Segundo ele, as sanções estariam sendo usadas como forma de pressionar o governo Lula e fortalecer Jair Bolsonaro ou aliados para uma futura retomada do poder. Trump teria interesse em ver o Brasil novamente alinhado com os EUA em temas como exploração de minerais estratégicos e regulação de Big Techs.
Em mais uma carta, divulgada em 18 de julho, Trump reforçou seu apoio a Bolsonaro:
“Não estou surpreso em vê-lo liderando nas pesquisas; você foi um líder altamente respeitado e forte que serviu bem ao seu país […] É minha sincera esperança que o Governo do Brasil mude de rumo, pare de atacar oponentes políticos e acabe com seu ridículo regime de censura. Estarei observando de perto”.
Essa mensagem veio pouco antes da operação da Polícia Federal — com aval do STF — que impôs tornozeleira eletrônica a Bolsonaro e o proibiu de usar redes sociais. O ex-presidente está inelegível, mas nega qualquer envolvimento em tentativa de golpe, como quer fazer crer o sistema que o persegue.
Enquanto isso, o vice-presidente Geraldo Alckmin continua tentando negociar com o Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR), mesmo sem sucesso prático. O governo também busca apoio de empresários brasileiros para pressionarem seus parceiros comerciais nos EUA contra as tarifas, alegando que os americanos vão pagar mais caro por produtos comuns, como café e suco de laranja.
Uma missão parlamentar liderada pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS) embarcará para Washington nos próximos dias com o mesmo objetivo: tentar convencer congressistas americanos a barrar as tarifas.
Nos bastidores, porém, um dos maiores entraves, segundo fontes do governo, é o fato de que as decisões da Casa Branca estariam sendo conduzidas fora dos canais diplomáticos usuais. As medidas estariam partindo diretamente do círculo próximo de Trump, com forte influência de aliados de Bolsonaro, incluindo Eduardo Bolsonaro, que reside atualmente nos EUA.
Enquanto prepara possíveis retaliações — incluindo propostas de taxação sobre plataformas digitais americanas — o presidente Lula tem sido contradito até dentro de seu próprio governo. Após Lula dizer que o Brasil vai “julgar e cobrar impostos das empresas americanas digitais”, o Ministério da Fazenda rapidamente desmentiu a proposta.
“O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nega que o governo brasileiro esteja avaliando a adoção de medidas mais rigorosas de controle sobre os dividendos como forma de retaliação […] e reafirma que essa possibilidade não está em consideração”, afirmou o Ministério nas redes sociais.
Fontes do Planalto afirmam que, até o momento, nenhuma decisão concreta sobre retaliação foi tomada. O governo quer evitar antecipar alvos e estratégias, pois teme que novas sanções ainda possam surgir. Rumores apontam possíveis retaliações nas áreas de patentes de medicamentos e direitos autorais de produtos culturais americanos.
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